A EVOLUÇÃO DA ESPÉCIE HUMANA e DAS VIAS NEURONAIS QUE COMPÕEM NOSSO CÉREBRO
A evolução do homem até o Homo sapiens foi um processo complexo que ocorreu ao longo de milhões de anos. Durante a leitura do livro: As últimas notícias do SAPIENS, de Silvana Condemi e Francois Salvatier, verificamos que tudo começou com ancestrais comuns aos humanos e aos grandes símios, como os Australopithecus, e progrediu através de várias espécies, como o Homo habilis e o Homo erectus, até chegar ao Homo sapiens. O bipedismo, ou a capacidade de andar sobre duas pernas, foi uma característica fundamental nesse processo. Ele permitiu que os hominídeos se libertassem das restrições do ambiente arbóreo e explorassem novos habitats terrestres, influenciando o desenvolvimento da locomoção, da cognição e da anatomia humana. O bipedismo liberou as nossas mãos. Sua evolução influenciada pela cultura, especialmente na fabricação de ferramentas, transformou-a numa verdadeira máquina, como ferramenta programável cujas proezas são espetaculares; milhares de sensores e uma parte enorme do cérebro lhe servem de guias. Essa extremidade tão particular é um dos resultados distintivos da hominização, e nossa mão, diga-se de passagem, muito se distingue dos outros hominídeos.
Vejam que nossa mão é constituída de 29 ossos, um número idêntico de articulações, de 35 músculos e de uma vasta rede de nervos, artérias e, sobretudo, mais de cem tendões! Nossas falanges não são curvas como as dos macacos, mas retas. Nosso polegar, o mais robusto dos dedos, é opositor, e seu controle mobiliza sozinho nove músculos e três nervos principais da mão. É graças a essas múltiplas ligações, comparáveis aos fios de uma marionete, que nossos dedos se movem individualmente com... destreza. No entanto, o bipedismo também provocou uma nova disposição do conjunto do corpo, que nos permite correr e a corrida nos fez perder nossos pelos. A cultura modificou nossa biologia, que por sua vez evoluiu a fim de proporcionar... mais cultura. Este fenômeno pode ser observado primeiramente em nossa procriação, que se tornou cada vez mais cooperativa, após ter aumentado e, depois, ultrapassado os limites reprodutivos dos primatas; ele se observa em seguida em nossa fisiologia, favorecendo a estocagem de gorduras a serviço de um grande cérebro, cuja emergência nos levou a explorar os animais ricos em gordura e as plantas energéticas. A cultura trouxe a superfície, a linhagem humana, acelerando a evolução de certas linhagens de australopitecos fabricantes de ferramentas em direção a um maior bipedismo e eficácia na exploração do território.
O aumento da estatura e do volume encefálico atesta o acionamento desse mecanismo de hominização, que produziu grupos sociais humanos maiores, sustentados por uma "higiene linguística". O crescimento do cérebro do Homo sapiens e do chimpanzé podem nos mostrar como foi a evolução e o desenvolvimento do cérebro humano durante milhares de anos. Os estudos antropológicos mostram que o volume do crânio do chimpanzé até o Pan troglodytes foi de 2,5 X e do homem até o Homo sapiens foi de 4X, quando comparamos ambos os crescimentos até os 8 anos de idade. Desde o início dos tempos, o custo desse cérebro grande se traduz em vidas perdidas para mulheres e bebês, mas isso não nos impede de possuir a mais forte demografia de todos os animais. Um trabalho de parto dura cerca de 9h e 30 minutos, ou seja, cinco vezes mais do que o gorila, chimpanzé ou orangotango… Isso é facilmente explicado pelo volumoso cérebro humano, que em nossos recém nascidos, passa com dificuldade pelo canal pélvico. Disso resultou uma seleção das linhagens humanas nas quais os ossos cranianos dos bebês antes de nascer, apresentam-se com suturas ou ”moleras”, permitindo que ocorra uma certa deformação da cabeça para facilitar a passagem pela cavidade pélvica da mãe.
No entanto, nossos bebês nascem com um crânio e cérebro inacabados, quase absurdamente imaturos em comparação ao que ocorre nas outras espécies de animais. Desta forma, o cérebro humano conclui seu crescimento cerebral, quando a criança já está sob influência da vida social, por volta dos 7 anos. Essa particularidade que explica parcialmente, nosso impressionante progresso cognitivo, visto que nosso cérebro atinge cerca de 86 bilhões de neurônios, comparados aos “meros” 6 bilhões nos chimpanzés. O desenvolvimento lento do cérebro humano só é inteiramente possível se os pais viverem por muito tempo: ao contrário das centenas de peixes fêmeas que põem com frequência 500 mil ovos, onde a maior parte é devorada por predadores. A estratégia da reprodução humana consiste em aliar um número baixo de nascimentos a um forte investimento parental. É por esta razão que ao longo de milhões de anos, a cultura humana desempenhou um papel crucial na criação das crianças, que progressivamente, foi completada por uma quantidade cada vez maior de educação. Possuindo uma vasta experiência útil a sobrevivência dos bebês, as avós se dedicaram há muito tempo a criação de netos e netas e este investimento tem sido eficaz em termos de sobrevivência das nossas crianças. Em meu livro: Perseverança a escalada de um jornaleiro até a neurocirurgia, demonstramos todo este processo evolutivo no capítulo 5, onde falamos sobre a inteligência emocional as vias proprioceptivas e a infância, narrando todo processo evolutivo com detalhes sobre a evolução das vias neuronais que compõem nosso sistema nervoso central.
Por Valério Marcelino Braga Neurocirurgião
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